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jun 19 2020

Ibaneis aponta omissão da PM em atos antidemocráticos no DF; leia entrevista na íntegra

Ibaneis Rocha avalia seu primeiro ano de governo – Agência Brasília

Atos antidemocráticos na capital do país motivaram investigações, prisões e exonerações nesta semana. Em meio à crise na saúde e movimentos extremistas em Brasília, a conduta dos órgãos de segurança da capital gerou repercussão. Em entrevista ao G1, o governador Ibaneis Rocha (MDB) apontou “erros” na conduta da Polícia Militar e destacou que “sabe usar a caneta”.

No domingo (14), a Esplanada dos Ministérios foi fechada após manifestantes lançarem fogos contra o prédio do Supremo Tribunal Federal (STF). O grupo fazia parte do acampamento desmobilizado durante uma operação do GDF no mesmo dia. Segundo Ibaneis, a PM sabia que o ato ocorreria, mas não atuou para “uma garantia maior de segurança”.

O caso resultou na exoneração do então subcomandante-geral da Polícia Militar, Sérgio Luiz Ferreira de Souza. O coronel Cláudio Fernando Condi foi nomeado para o cargo nesta sexta-feira (19). Em reação à demissão do militar, o Fórum das Associações Representativas dos Policiais e Bombeiros do DF divulgou uma nota afirmando que o governador cometeu “injúria” e que a demissão do número 2 da corporação foi “uma forma de mostrar força política perante ao Palácio do Planalto”.

“Eu não tenho a necessidade de mostrar força, até porque força eu tenho. […] Eu sei o peso que eu tenho dentro do cenário nacional”, disse o governador.

Durante a entrevista, Ibaneis se referiu ainda ao grupo de apoiadores do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) como “acampamento dos 30”, em alusão ao número de integrantes. A conversa também abordou os seguintes temas: Atos antidemocráticos em Brasília; exoneração na PM; fechamento da Esplanada dos Ministérios; ameaças à Cúria Metropolitana; pandemia do novo coronavírus e uso obrigatório de máscaras e pedido ao presidente Bolsonaro

Veja a entrevista:

G1 – O governo ficou sabendo da possibilidade de um ataque ao STF antes ou depois da desmobilização do acampamento?

Ibaneis Rocha – Nós ficamos sabendo por meio da nossa inteligência que havia alguma intenção de que fizessem alguns atos antidemocráticos e de ataque ao Supremo. Essa foi uma das razões da desmobilização do ‘acampamento dos 30’.

G1 – No momento da desmobilização foi possível identificar se havia materiais explosivos com eles?

Ibaneis – Naquele momento não havia qualquer tipo de material explosivo, se tivesse, teria sido apreendido. O que ocorreu ali: já havia alguns chamamentos deles para aquela manifestação à noite, que já estavam circulando nas redes sociais. Através disso, já se notava que haveria algum movimento antidemocrático junto ao Supremo Tribunal Federal, o que se confirmou com aqueles fogos que foram lançados.

G1 – Na sua avaliação, então, houve uma omissão por parte da PM? A PM sabia e se omitiu?

Sim. A partir do momento em que eles desmobilizaram o ‘acampamento dos 30’ era facilmente previsível de que aquilo não ficaria sem uma resposta.

Eu não estou aqui colocando nenhum tipo de culpa, mas do ponto de vista administrativo, eu entendo que houve, sim, um erro do comando da Polícia Militar ao não ter já preparado ao redor, tanto do Congresso Nacional quanto do Supremo Tribunal Federal, uma garantia maior de segurança. “Foi por esse motivo que eu exonerei o comandante da Polícia Militar.”

G1 – O fórum que representa os policiais militares divulgou uma nota em repúdio à sua fala sobre a omissão da PM [em entrevista à Folha de S. Paulo], no caso do ato contra o STF. Cita, inclusive, a intenção de ir à Justiça para reparos por danos morais, por injúria. Qual é sua avaliação?

Ibaneis – Eu acho que essas associações de policiais têm seus direitos garantidos na Constituição, e o poder Judiciário está aberto a qualquer um. Se quiserem entrar com uma ação, se for contra mim, eu vou responder pessoalmente. Se for contra o governo, através da Procuradoria-Geral [do DF]. Mas é o direito de qualquer um buscar o Poder Judiciário, tendo ou não fundamento.

G1 – Tem um outro ponto da nota que afirma que a exoneração seria “uma forma de mostrar força política perante ao Palácio do Planalto”. Qual é sua avaliação sobre essa visão?

Ibaneis – Olha, eu digo sempre que têm dois tipos de cartões: tem a carta branca e tem o cartão vermelho. Todos que trabalham comigo têm carta branca. Agora, quando eu entendo que é um ato que não está de acordo com aquilo que eu penso ou que deveria ser feito naquele momento, eu aplico o cartão vermelho. “Eu não tenho a necessidade de mostrar força, até porque força eu tenho. Eu não sou parecido com elefante. Eu sei o peso que eu tenho dentro do cenário nacional. Elefante é que não sabe o peso que tem.”

G1 – Existe uma discussão sobre o possível apoio da PM mais ao Palácio do Planalto do que aos governadores, o senhor se preocupa com isso nesse momento?

Ibaneis – A Polícia Militar do Distrito Federal é extremamente preparada, sempre demonstra grande preparo. Policiais militares e as policiais militares do Distrito Federal, assim como o Corpo de Bombeiros, como a Polícia Civil, são reconhecidas no Brasil como uma das melhores forças de segurança que tem dentro dos Estados. Eu não entendo nada disso e não entendo que haveria, por parte dos policiais, qualquer movimento de insurreição ou qualquer coisa que se queira dizer. A Polícia Militar do Distrito Federal é preparada, está muito bem comandada pelo comandante Julian [Pontes] e eu tenho certeza que as coisas vão andar bem e vai dar tudo certo. Nós vamos ter outras manifestações pacíficas que é isso que o Distrito Federal precisa.

G1 – O senhor nega que haja uma tensão entre a PM e o governo?

Ibaneis – Nunca existiu. Essas associações falam, mas geralmente são grupos ali que estão reunidos, e que, em sua grande parte, não estão sequer na atividade mais e não estão em contato com o dia a dia dos policiais. Eu tenho certeza que eu tenho o reconhecimento das forças policiais no Distrito Federal, até porque desde o primeiro momento eu encaminhei o pedido de reajuste das Forças de Segurança, eu negociei junto ao Palácio do Planalto todo o reajuste deles.

Eu trabalhei junto ao Congresso Nacional. Tanto que o relator da proposta foi do meu partido, Eduardo Gomes [MDB-TO]. Então eu tenho toda a tranquilidade e todo o apoio e o respeito das forças de segurança do Distrito Federal.

G1 – Como o senhor até tocou no assunto da remuneração desses policiais, houve o parecer pela paridade, da AGU. Isso tem força de lei? Sabemos quantos policiais civis serão beneficiados?

Ibaneis– Eu não tive a oportunidade ainda de ler o parecer. Respeito muito, até porque se partiu do advogado-geral da União deve estar muito bem fundamentado. Até porque eu conheço o ministro [José] Levi, tenho certeza de que ele não faria nada que tivesse alguma coisa de inconstitucionalidade. Agora, eu quero analisar e ver junto à Secretaria de Economia se nós vamos ter condições de cumprir ou não. Se não tiver, nós vamos pedir recurso ao governo federal.

Voltando para o assunto das manifestações, o governo fechou a Esplanada nos últimos dias. O decreto citou ameaças à Cúria Metropolitana. Isso chegou diretamente ao Executivo? Como tem sido esses monitoramentos?

Ibaneis – Desde que eu assumi o Palácio do Buriti, eu criei uma assessoria para cuidar dos assuntos religiosos, que é dirigido por um advogado conhecido meu, que foi presidente da comissão de assuntos religiosos da OAB que é o Kildare [Araújo Meira]. Ele mantém contato com todos os setores religiosos, todos os credos. Chegou para ele um pedido feito diretamente pelo Dom Marcony [Ferreira, bispo auxiliar de Brasília], dizendo que havia recebido ameaças.

Naquele momento, o que me competia como administrador da cidade era garantir a Dom Marcony e a Cúria toda a segurança. Foi fechada a Esplanada por esse motivo. E nós estamos oferecendo segurança também a Dom Marcony e também ao arcebispo Dom José Aparecido.

G1 – Foi uma ameaça à integridade física?

Ibaneis – O que ele relatou é que recebeu conteúdos de ameaças mas isso vai ser apurado pela polícia. Eu não tenho que ficar esperando se é ameaça física, se é ameaça ao patrimônio…

Existindo a ameaça, eu tenho que proteger as autoridades. E eu entendo que autoridades eclesiásticas também merecem essa proteção.

G1 – O governo considera hoje a possibilidade de novos fechamentos na Esplanada?

Ibaneis – Eu tenho notícia de que haverá outras manifestações. Desde que essas manifestações sejam pacíficas, sejam ordeiras, não tenham um conteúdo de ameaças, elas podem ocorrer na Esplanada com toda tranquilidade. Eu não tenho nenhum problema com isso. Venho de um setor muito democrático que é o da ordem. Fui presidente da OAB, foi diretor do Conselho Federal da Ordem, corregedor nacional. Então, aprendi a conviver muito nesse ambiente democrático, onde as pessoas se manifestem de forma livre.

O que nós vimos nos últimos anos aqui no Brasil foi exatamente isso. Nós passamos por “fora Dilma”, “fora Temer”. O que nós não podemos conviver são com ataques às instituições da República. E aí, isso, eu vou coibir com as forças que eu tenho aqui com as nossas polícias.

G1 – Podemos definir qual seria o limite dessas manifestações?

Ibaneis – Eu, por exemplo, consigo delimitar isso muito fácil. As manifestações anteriores a esse último final de semana – tirando alguns eventos pontuais onde se colocavam ataques ao Supremo, retorno à ditadura – mas, a grande maioria ocorreram de apoio ao presidente Bolsonaro. Então, o limite é o seguinte: quando a manifestação é em apoio a um determinado Poder, ou a uma determinada autoridade pública, está dentro da normalidade. A partir do momento em que descamba para a inconstitucionalidade buscando movimentos, por exemplo, nazistas, movimentos antidemocráticos no que diz respeito ao ataque às instituições, eu acredito que isso aí descamba um pouco para aquilo que está contrário à Constituição e as leis da República e é a hora de atuar.

Agora, você consegue notar, e é muito difícil.. Pode ter pessoas infiltradas, como o próprio presidente diz, pode ser um movimento orquestrado com financiamento, isso tudo está sendo apurado pelo Supremo Tribunal Federal.

G1 – Em meio à manifestações, estão em vigor no DF medidas de prevenção contra o coronavírus. Sempre que falamos sobre fiscalização surge o questionamento sobre por quê o presidente não é multado…

Ibaneis – Eu tenho trabalhado muito na linha da orientação. Tanto, que nós só temos 3 multas de pessoas aqui no Distrito Federal de pessoas que resistiram ao uso de máscaras. Certo? Então, o que nós temos feito é uma abordagem no sentido de orientar as pessoas. Então, quando encontramos, a primeira coisa que você faz é oferecer a máscara. Se a pessoa resistir a receber, colocar a máscara, é que nós encaminhamos para a delegacia e é feito um B.O.

No caso do presidente Bolsonaro, nós sabemos que ele tem esse carisma, esses atos populares que ele adota sempre. Em um deles, ele tirou a máscara. O que eu fiz foi pedir a ele, através de sua assessoria, entrar em contato com o ministro [Luiz Eduardo] Ramos [da Secretaria de Governo] e ministro Jorge [Oliveira, da Justiça], solicitando a ele. E eu tenho visto que o presidente tem adotado.

Sem máscara, Bolsonaro percorreu a pé o cercado em frente ao Palácio do Planalto e cumprimentou seus apoiadores — Foto: Reprodução

O que diz respeito à aglomeração, eu não decretei multa no sentido de evitar. O que se pede é que as pessoas respeitam a distância mínima. A gente sabe que, às vezes, dentro desses movimentos não há contento.

Acho muito difícil você mandar um fiscal ir a uma aglomeração que tem 4, 5, 6 mil pessoas para multar, que ele vai sair de lá linchado. Então, nós temos que saber o limite da realidade. O limite do poder público caminha também no limite da realidade.

No caso do ministro Abraham Weintraub, […] ele foi deliberadamente, se você olhar, as pessoas que estão ao redor dele, todas elas estavam com as máscaras, pelo menos, penduradas, sinal de que estavam utilizando. Mas ele , deliberadamente, foi participar de uma manifestação em um ambiente que já estava fechado, eu já tinha decretado o fechamento da Esplanada, ele foi sem qualquer tipo de máscara, ou seja, não mostrou nenhum sinal de respeito. E aí, eu pedi ao pessoal do DF Legal, e são eles que fazem isso, para que aplicassem a multa ao ministro, até em um sentido pedagógico.

G1 – Para uma pessoa da área do direito, como o senhor, há especialistas que afirmam que o presidente estaria imune aos decretos do GDF. Concorda com essa avaliação jurídica?

De maneira nenhuma. Eu não vejo nenhum choque de legislação e nenhuma proteção da Constituição, por ele ser presidente da República, de ele não ter que atender. Acho que os Poderes são delimitados, inclusive, a decisão do Supremo Tribunal Federal foi muito clara com relação a esses Poderes. Compete aos governadores e aos prefeitos editar os atos que dizem respeito ao coronavírus. Então, estou agindo dentro da minha competência constitucional, tanto dos direitos que estão lá previstos quantos os que a Lei Orgânica Federal me competem.

G1 – De forma geral, é importante dizer sobre a importância moral também de usar a máscara independente do cargo…

O que eu digo aqui é que o máximo que eu consigo do ponto de vista de autoridade de governador, é dar às pessoas o atendimento à saúde e orientar. Até porque essa é uma doença nova que ninguém sabe quando vamos ter medicação segurança, quando é que vamos ter vacina. Então, a gente tenta orientar a população para que usem máscara, manter o distanciamento social, dentro dos estabelecimentos sociais, que seja feita higienização, uso do álcool em gel, é a orientação geral que vem desde a Organização Mundial de Saúde e que os governantes, pelo que eu vejo no país, tentam adotar. Agora, a partir daí, só com Deus, né.

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