Quase sempre aceito tudo, nesta sociedade acomodada, mas de vez em quando me acende uma luz: a luz da reação consciente.
Assim, garotos e garotas, vejo como uma barbaridade o relançamento da mesóclise pelo presidente Michel Temer. E faço cobrança pública: ninguém chiou, ninguém vaiou, ninguém analisou! Nem eu!
Ao contrário: todos nós rimos, achamos engraçadinho, quando ele deu o mau exemplo de falar difícil. Crianças, não levem Temer a sério!
Faltou ao presidente a autoridade de um bom assessor de Comunicação, que berrasse assim: “Não! Pelo amor de Deus, NÃO! Presidente!”
Hoje, tardiamente, digo:
—-A mesóclise vai entrar na biografia de Temer da mesma forma ridícula que entrou o Fusca na vida do presidente Itamar Franco.
Itamar fez muito pelo Brasil, na década de 90. Inclusive deu o tiro fatal na inflação, com o Plano Real. Mas morreu abraçado ao Fusquinha – que ele mandou inutilmente fabricar de novo e não pegou, é claro.
Temer já começa a fazer muita coisa no seu curto governo, mas será lembrado pela tarefa boba de “dividir o verbo para enfiar um pronome”, da forma que ninguém mais faz – nem quer.
Aprendi que há três colocações dos chamados pronomes oblíquos átonos:
Próclise – Você vai se informar (usada pelas pessoas normais).
Ênclise – Você vai informar-se (usada pelos mais “finos”).
Mesóclise – Você informa-se-á (forma usada pelas pessoas ridículas)
EVOLUÇÃO DA LINGUAGEM ESCRITA NO BRASIL
Na década de 60, um jovem professor de Português, nos Maristas de Salvador, me mostrou que a linguagem e a literatura do Brasil tinham evoluções fantásticas. Isso há 50 longos anos!
Ele nos apresentou o célebre Poema da Pedra, de Drummond (no meio do caminho tinha uma pedra, tinha uma pedra no meio do caminho). Eu, garoto despreparado e conservador, achei horrível!
O que gostei mesmo foi da aula sobre Jorge Amado. O interessante professor (pena não lembrar o nome dele) falou de ênclise, próclise e mesóclise. Esta última foi apontada por ele como em desuso, prestes a desaparecer, pois fora rejeitada pela população brasileira no século XX. Concordei plenamente!
Fiquei fã de Jorge Amado (isso é fácil para um baiano!), quando o professor disse que este escritor comunista, proibido no Colégio Maristas, estava impondo nos seus livros a linguagem das ruas, inclusive com os palavrões (já havia lido Capitães de Areia e me impressionei pela agressividade das palavras).
Fiquei sabendo que Jorge Amado assustou os amantes de Machado de Assis ao usar somente a próclise nos seus textos romanceados. Vejam esta frase do grande romance Jubiabá: “No negro Antônio Balduíno nada se incorporou”.
Se fosse Michel Temer, a frase ficaria assim: “No negro Antônio Balduíno nada incorpora-se-ia”. Que terror!
A mesóclise é tão superada quanto o relógio de bolso, o fraque, a carruagem e a cartola (que muitos de vocês nunca viram). Na verdade, a mesóclise deve ser combatida como a gente combate hoje o fumo – prejudicial e inútil.
É compreensível que a forma pedante de se colocar pronomes seja ainda usada pelos retrógrados integrantes do Supremo Tribunal Federal. Eles estão 200 anos atrás da sociedade. Quase múmias!
Me pergunto: quando aparecerá um ministro corajoso no STF, que possa repudiar o uso da horrível e empoeirada toga, capa de Drácula? Eles se vestem de mesóclise, com molho de latim.
E assim vamos.
Temer pode fazer no Brasil a reforma da Previdência, controlar a inflação, reformar as leis trabalhistas, fazer a economia crescer, etc.
No entanto, far-se-á conhecido pela má idéia de empregar a mesóclise, apenas para se fazer diferente de Dilma Rousseff. Que desperdício! (RENATO RIELLA)