Aylê-Salassié Filgueiras Quintão*
Se na troca de emails diários nas redes sociais aparecer o emoji de um coração, é bom verificar a cor. Tem significados diferentes, e alguns podem estar indicando um stress – tensão e instabilidade emocional – que a pessoa está vivendo, associado ou não à quarentena do Convid 19, podendo resultar em consequências dramáticas.
Assim, coração da cor laranja significa indiferença; verde, problemas inconfessos no relacionamento; azul, fetiches; preto, humor negro ou tristeza; marrom, algo tenebroso. Outras cores indicam alegria, paz ou amor, até paixão – difícil na pandemia. Mas, não se iluda. É uma linguagem de solitários, indecisos e angustiados que já não conseguem expressar a agonia existencial.
Chama-se “síndrome do coração partido”, conhecida na medicina como “cardiomiopatia de Takotsubo” um mal que afeta o músculo cardíaco , ao provocar a expansão do ventrículo esquerdo, produzindo no peito uma dor intensa, tipo infarto, muitas vezes mortal ; outras desestabilizadora da capacidade mental.
Diria que é a metáfora que mata. Coração partido refere-se quase sempre à dor física como resultado de perdas materiais ou imateriais: do emprego, da liberdade, de um familiar e outras por aí. Um incidente traumatizante desencadeia no cérebro a distribuição de substâncias químicas que enfraquece o miocárdio, músculo que assegura a distribuição sanguínea no corpo. Tende a produzir, por extensão, traumas emocionais, que, por sua vez, podem surgir também, sem dor somática, em um coração “emojizado” com a cor branca, que significa estar em calma e em paz : exterior ou interior – eis aí o problema difícil de ser detectado.
Ao longo desse processo tem surgido práticas e frustrações muito estranhas, como fazer sexo virtual ; credos diferentes justificando os efeitos da pandemia como uma provação necessária para alcançar o reino celestial; a interrupção de pesquisas sobre o prolongamento da vida humana; em tempos de escassez monetária, dinheiro saindo de tudo quanto é lugar; e até mesmo a perda de interesse pelo o que existe além-túmulo, pregada por aqueles homens de batina preta. Virou tudo coisa meio assombrada, com promessas de um retorno à relações sociais primitivas.
Pode parecer sofismático, mas pesquisas na Inglaterra e nos Estados Unidos estão revelando um aumento superior a 5 % dessa síndrome do coração partido durante a disseminação da pandemia. Quanto mais ela se estende no espaço e prolonga no tempo, mais corações partidos vão aparecendo. Milhares de pessoas reclusas estão sendo aos poucos afetadas pelos efeitos da pandemia, cujos sintomas mais comuns são: a nostalgia, ataques de ansiedade, dor no estômago, perda de apetite, insônia, apatia, náusea, fadiga e depressão crescente. Falar demais no Whats Up é um indicador. Preventivamente, espera-se, já é anunciada uma segunda onda pandêmica, manisfestada no Cazaquistão. A OMS está informando sobre o virus A H1N2 detectado, pela Fiocruz, em porcos no Brasil. Um caso registrado. É preciso ter cuidado, há quem invista em um mundo pandemicamente sindrômico.
Não ignore, entretanto, o emoji do coração. Não se trata de um simples ícone ou uma metáfora vulgar politizada. Tem algo estranho acontecendo. A pessoa já não consegue descrever a dor física ou expressar o constrangimento patológico. É a linguagem de um silêncio temerário.
· *Jornalista e professor