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fev 16 2018

ARTIGO: Guerra declarada

ANDRÉ GUSTAVO STUMPF, jornalista

Há muito tempo, os soldados do tráfico de drogas demonstram estar mais organizados e preparados que as tropas das polícias militares em várias cidades do Brasil.

No caso específico do Rio de Janeiro, o assunto ganha mais visibilidade porque ali está a sede da maior rede de televisão do país.

A cidade continua linda e a funcionar como porta de entrada para o turismo. Está em curso uma guerra não declarada. Conflito que ultrapassa em muito a capacidade de resposta dos efetivos locais.

A decisão de realizar a intervenção federal no Rio de Janeiro implica no reconhecimento do estado de guerra que se instalou ali.

Os traficantes operam com armamento pesado (AR-15, AK-47, mísseis de curto alcance, entre outras maravilhas). São equipamentos semelhantes ao que são utilizados no Iraque e na Síria.

Os números de mortos e feridos naqueles cenários são semelhantes aos verificados no Rio. É absurdo o número de policiais, traficantes, civis, crianças e turistas alcançados pela violência.

O governo federal custou a entender a realidade da guerra. Desde o confronto com o Paraguai, no século 19, não há por aqui o menor sinal de conflito bélico.

O tráfico de drogas, e seus efeitos colaterais, afetaram profundamente Colômbia e Bolívia. Naqueles países a ação dos traficantes alcançou dimensões dramáticas.

Na Colômbia, chegou a vigorar um acordo com o governo dos Estados Unidos, que permitia a aviões daquele país bombardear com produtos químicos os campos de produção de cocaína. Os aviões norte-americanos voavam desde Miami até uma base secreta no Equador. E vasculhavam o país de cima abaixo.

O problema está sendo resolvido agora. O comando das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC) abandonou a guerrilha e decidiu disputar votos para chegar ao governo por intermédio do sistema democrático. Parte das milícias ainda não assinou o acordo de paz. Mas a tendência é haver consenso.

A Colômbia lidou com sua guerrilha interna por quase sessenta anos. Em determinados momentos, as FARC dominaram grandes partes do território, restando ao governo federal apenas o comando de Bogotá e arredores. Houve demora em perceber que o inimigo era o traficante de drogas.

O adversário da democracia na América do Sul há algum tempo deixou de ser o guerrilheiro adepto dos ideais de Che Guevara. A esquerda no Brasil não entendeu o novo fenômeno.

Os governos chamados de bolivarianos estão caindo um atrás do outro na região. Os traficantes, ao contrário, controlam o cidadão que o Estado não consegue proteger. Utilizam mão de obra de menores de idade e lidam com quantidades inimagináveis de dinheiro.

Eles têm o poder de corromper desde o guarda de esquina até as mais altas autoridades do governo. Têm condições de influir até mesmo nas forças armadas.

As polícias não têm capacidade de enfrentar o inimigo. Essa é uma guerra diferente. Exige muito trabalho de informação, comunicação perfeita, rápida e protegida. Por essa razão é razoável que se siga à intervenção federal no Rio de Janeiro, a criação do Ministério da Segurança.

O governo federal precisa se preparar para enfrentar um inimigo bem armado, organizado e ousado. Não se detém diante da primeira dificuldade. Será necessário integrar as ações das polícias militares, elevar o nível de fiscalização nas penitenciárias e capacitar os agentes na rua.

Isso tudo é novidade no Brasil. É claro que a necessidade de proteger as fronteiras deverá figurar entre as prioridades. Estes temas não constavam das agendas dos últimos governos. O governo brasileiro demorou, mas abriu os olhos para a realidade no continente.

O inimigo é o traficante. Os maiores produtores de cocaína estão do outro lado da fronteira: Colômbia, Peru e Bolívia. O Brasil é importante mercado, mas também corredor de passagem da droga a caminho da Europa. Essa é a nova realidade. E cessa tudo o que a antiga musa canta.

A novela da reforma da Previdência Social poderá retornar ao centro das preocupações políticas na próxima semana. Os porta-vozes do Governo informam que o Palácio do Planalto dispõe, somente, algo em torno de 270 votos. Mas para aprovar a Emenda Constitucional é necessário conseguir três quintos dos votos ou 308 manifestações favoráveis.

Salvo alguma manifestação inesperada ou a ocorrência de fato surpreendente, o encaminhar das ações indica que o Presidente Temer não vai levar esta.

A intervenção federal poupa o governo federal de uma derrota anunciada. Enquanto durar este ato extremo, não pode ocorrer nenhuma mudança na Constituição. Ou seja, a reforma da previdência fica para o futuro. Ou para o próximo governo.

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