Com dez anos de trajetória, a Cia do Sopro encena Medea, uma versão contemporânea do dramaturgo inglês Mike Bartlett para o clássico de Eurípedes. O espetáculo, dirigido por Daniel Infantini, tem patrocínio da Caixa Cultural e faz curta temporada de 31 de maio a 2 de junho de 2024 na Galeria da Caixa Cultural Brasília, com apresentações de sexta e sábado, às 20h, e no domingo, às 19h.
Formada por Fani Feldman, Rui Ricardo Diaz, Plínio Meirelles e Antonio Januzelli, a Cia. do Sopro tem em sua trajetória os espetáculos A Hora e Vez e Como Todos os Atos Humanos. Já Mike Bartlett, autor dos sucessos Love, Love Love, Contractions e Bull, é considerado um dos mais ousadosdramaturgos da geração emergente da Europa.
A versão inglesa deste clássico grego suscita reflexões acerca da condição da mulher nos dias de hoje. A nova montagem traz no elenco Fani Feldman (Medea), Rodolfo Amorim (Jasão), Juliana Sanches (Pam), Maristela Chelala (Sarah), Plínio Meirelles (Andrew) e Bruno Feldman (Carter).
A peça é um dos grandes clássicos do teatro grego. Nesta montagem, o público se depara com uma mãe, negligenciada, traída, abandonada, acuada, entre a gravidez e o puerpério. Esta Medea, não foge à regra da mulher que, atravessada pela cadeia de violências diárias, físicas e emocionais, se desfaz em um corpo e mente destruídos. A protagonista vilipendiada, eviscerada por uma sociedade alicerçada pelo machismo estrutural, fala integralmente aos dias de hoje, e infelizmente, ao Brasil de 2024, um país aterrorizado permanentemente por notícias diárias de abuso e feminicídio.
Medea reage para sobrevir e em resposta a todo o abuso, só consegue responder com a ruína. A consequência trágica é inevitável quando não é
possível sequer vislumbrar uma saída. Medea é, portanto, um emblema capaz de traduzir sintomas perversos deste nosso tempo, e refletir com apuro o terror contido nas aparências da banalidade.
Em sua adaptação, Mike Bartlett transporta o território e a realidade originais da Grécia Antiga a um terreno suburbano localizado em um conjunto
habitacional, análogo às periferias de cidades grandes ao redor do mundo. Em tempos tão alarmantes e retrógrados como os atuais, nos quais as chagas sociais estão a olhos vistos, não há dúvida de que a tragédia grega está absolutamente presente na sociedade moderna assim como esteve na Grécia antiga, mas, para além da manutenção das linhas de força que conduzem o mito, na obra composta por Bartlett há evidências
contemporâneas prementes que necessariamente estão consideradas nesta empreitada.
O estado geral desta Medea agrega condições análogas às de eventos, cotidianamente assistidos por muitos de nós, que tendem a terminar de modo trágico. A mulher de nosso tempo é atuante nas diversas esferas da realidade, mas tem seu espaço ainda subjugado pelas forças contrárias à emancipação efetiva de seus direitos. É por esta vereda e seus meandros que a Cia do Sopro investiu seu intento e elegeu esta Medea, como uma potência radical capaz de refletir sobre o estado de coisas da condição atual da mulher.
Fonte: Âncora Comunicação – Carla Spegiorin
Foto: Divulgação