ALFREDO PRADO
Não há pior cegueira do que aquela de quem não quer ver. A vida sempre nos mostra que o ditado, cujas raízes se perdem no tempo, continua atual. A greve geral que mobilizou o Brasil, convocada por mais de uma dezena de centrais sindicais, evidenciou que, ao contrário do que procuram vender os ministros do presidente Temer, o país está insatisfeito e zangado. Muito.
Que está insatisfeito com o presidente Temer não é surpresa. Afinal, isso mesmo o indicam, uma após outra, as pesquisas de opinião que atribuem ao ex-aliado de Lula e de Dilma um dos mais baixos índices de popularidade e de crédito político de um presidente desde que as sondagens são feitas.
Temer tem afirmado e reafirmado que não se deixa perturbar pela falta de popularidade. O que, a meu ver, é, por si só, uma afirmação preocupante. Um presidente, um primeiro-ministro, um parlamentar, prefeito, ou vereador que seja, que olha indiferente para a rejeição ou falta de apoio dos eleitores é caso, no mínimo, a merecer a atenção de especialistas.
A greve, que paralisou quase todo o país, merecendo destaque a grande mobilização dos trabalhadores de transportes – como o mostraram as imagens e reportagens exibidas pelas televisões, inclusive pela poderosa Globo, insuspeita de simpatias sindicalistas ou similares -, deu corpo e voz, nas ruas, à indisponibilidade popular para engolir reformas que o Planalto quer aplicar a toque de caixa…
Julgo que muitos aspectos das reformas trabalhista e previdenciária, que estão em cima da mesa, são pertinentes. Desde a CLT de Getúlio – esse gaúcho simpatizante de Mussolini e de Salazar – aos tempos modernos muita coisa mudou, inclusive nas relações laborais. É também verdade que o país precisa modernizar e adequar as leis e encontrar soluções para muitas questões, como a idade-base para aposentadoria, por exemplo.
Essas necessidades não justificam, no entanto, que – aproveitando-se da fragilidade de oposições parlamentares enredadas nos seus próprios pecados capitais, como é o caso do PT, – o governo queira entregar aos seus amigos de classe, em bandejas de prata e ritmo de urgência urgentíssima, antigos ou novos direitos dos trabalhadores.
Além de sensibilidade política – que não se confunde com matreirice política, que, essa, muitos dos atuais protagonistas da Esplanada dos Ministérios têm de sobra -, falta ao governo, e a grande parte dos parlamentares que dão luz verde aos desejos do Planalto, a respeitabilidade. Uma respeitabilidade que os políticos profissionais vêm perdendo, desde há muito, junto do Brasil honesto e honrado, que não está na mira dos investigadores da Lava Jato.
Vir a público minimizar a dimensão e o significado da greve geral, como o fez o ministro da Justiça, Osmar Serraglio, em Londrina, ajudado pelas ações de vandalismo de grupelhos provocadores, mais que miopia revela a tentação do governo se afundar no síndrome da avestruz.
A continuar assim, é pouco provável que Temer passe à história como o grande reformista, o que parece ser o seu maior desejo. Afinal, depois do pântano dos governos Lula e Dilma, teria sido tão fácil…bastaria ter se rodeado de homens e mulheres sérios, com projetos. E gente séria é o que não falta ao Brasil, apesar de tudo. (Do site Portugal Digital)